sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Vila de Rondônia vai desaparecer sob represa de hidrelétrica

Moradores ganharão novas casas em outro local. Parte deles teme ficar longe do rio que garante seu sustento

Inundada pela represa de Jirau, que está em construção no rio Madeira, a vila de Mutum-Paraná vai desaparecer. Por isso, 330 famílias terão de se mudar para uma cidade de casas pré-fabricadas.
A vila surgiu com a estrada de ferro Madeira-Mamoré, há cerca de 100 anos. A estrada foi desativada e Mutum-Paraná nunca mais acertou o pé. Passou por ciclos de garimpo, de madeira, sem sucesso permanente.

Expectativa

Para a maioria dos moradores, a construção das usinas é a salvação da economia local. "A expectativa é muito grande no sentido de comércio. Porque onde tem muita gente é melhor de trabalhar", acredita o comerciante Claudenir Oliveira.

A mudança será completa. Até os 140 túmulos do velho cemitério serão levados para a nova vila, a 50 quilômetros de distância. Um transtorno, mas o líder comunitário diz que será para melhor. "Nós vamos ter duas escolas, com condições de dobrar o número de alunos que hoje nos temos em classe", diz Jacob Benaroiz.

Os ribeirinhos, no entanto, não estão satisfeitos. As 763 famílias que moram na área da usina Santo Antônio vão ter que se mudar porque o lago vai invadir as margens do rio. "O que o pescador quer é permanecer na barranca do rio, ter livre acesso à barranca do rio", diz o pescador Pedro Damaceno.

Muitos ribeirinhos estão inseguros, não sabem se vão poder manter o seu jeito de viver, que é morar na barranca do rio, ao lado de seus barcos. Os reservatórios precisam manter uma faixa, em toda a margem, chamada Área de Proteção Permanente (APP). Os ribeirinhos, que são pescadores, acham que em suas novas casas vão ficar longe de onde tiram o seu sustento.

"Não adianta dar uma casa com alvenaria, com eletricidade, com água encanada. Porque eu tendo uma casa dessas não me serve de nada se eu não puder pescar", afirma o Coordenador da ONG Madeira Vivo, Jorge Ferreira.

O pescador Rômualdo Rodrigues Sales já se mudou e não gostou. Apesar da casa ampla e da boa infraestrutura da agrovila, ele reclama que ficou sem trabalho. "Vamos dizer que eu pegava 50, 60 quilos por semana. Farinha, muitas vezes, até vendia 18 sacos de farinha em dia de domingo. Hoje eu não tenho roça aqui."

Reportagem aberta para comentários. Deixe o seu ao final do texto.

Existe área para roçado, mas, na mudança, muita gente perdeu a época certa de plantar. A direção da usina reconhece: é difícil reproduzir aqui a vida que os ribeirinhos tinham antes. "Por mais que você faça em termos de melhorias, adequações, adaptações, sempre fica aquele lado sentimental, da família, da tradição, dos pais que ali moraram e que cultivaram toda a área", afirma o Coordenador de Sustentabilidade da Usina Santo Antônio, Luiz Zoccal.

Tem gente que acha que se deu bem. Valter Rodrigues da Silva, que é piloto de canoa com motor, conhecida na região como voadeira, recebeu casa e boa indenização. "Casa nova, as coisas tudo nova. Comprei uma voadeira, que não tinha condições de comprar uma voadeira para mim. Então, para mim está bom."

Tribos isoladas

Não há aldeias indígenas na área a ser inundada, mas lideranças temem impactos em tribos isoladas. O Ministério Público Federal abriu ação para proteger índios sem contato com o homem branco. "Os próprios antropólogos da casa estão fazendo um estudo para provar que a existência desses índios para que não seja liberado o empreendimento até que se resolva essa situação", explica a procuradora Luciana Pepe de Luca.

A Funai diz que há oito grupos indígenas isolados na região. As usinas se comprometeram a mantê-los protegidos. As hidrelétricas têm também de levar em conta nossos vizinhos, do outro lado da fronteira.

Os bolivianos estão de olho na construção das usinas em Rondônia. A bacia do Rio Madeira é binacional. De um lado, por exemplo, está a cidade de Guayaramerin, Bolívia, e do outro a cidade de Guajará-Mirim, Brasil. A fronteira é o Rio Mamoré, que forma o Rio Madeira. Os bolivianos querem saber se o represamento do rio terá conseqüências no território da Bolívia.

Pesquisadores bolivianos apontaram para o risco de inundações e redução da pesca. O engenheiro Maurício Tolmasquim, que participou da decisão de construir Jirau e Santo Antônio, diz que há desconhecimento em relação ao projeto. "É natural que haja desconfiança, mas não tem problema, inclusive existe hoje uma oferta do governo brasileiro de, se houver desejo, se construir uma usina binacional na fronteira e ajudar na construção da hidrelétrica lá na Bolívia. Então, não tem impacto e, ao contrário, a gente quer cooperar com os bolivianos".

Fonte: agazeta.net

0 comentários:

Arquivo do blog